Corrida

“Não vai dar tempo! Não vai dar tempo” pensava Clara correndo o máximo que podia. As pernas já estavam cansadas, pesadas, parecia que nunca tinham sido usadas, como se tivessem enferrujadas. A respiração queimava na garganta, nos pulmões, faltava saliva para umidecer a boca seca. Os olhos estavam chuvendo, só os olhos choviam.
“Não vai dar tempo”, pensou Clara mais uma vez. Estava escuro, mas fazia muito calor, seu corpo estava pegajoso, sujo. Tropeçou. “Droga!”, xingou baixinho. O dedão do pé esquerdo começou a latejar. Levantou e começou a andar, meio mancando, meio pulando. Não tinha tempo, correu de novo, ignorando as pontadas no pé.
Achou que estava chegando, começou a ver as luzes coloridas da entrada da cidade. Ouviu os rumores de conversa trazidos pelo vento. “Ou será que é o zumbido da velocidade?”, perguntou-se. Estava quase lá.
Acordou suando, com a garganta seca e o nariz entupido.

Carta

carta-apresentacaoSinto muito. Talvez até desse certo, em um outro momento. Antes, talvez. Num outro momento, numa outra vida, numa realidade paralela. Não agora. Agora você chegou tarde demais. Uma hora errada, um dia errado.

Não me venha com esses sorrisos bobos, como quem encontra um presente em cima da cama no dia de Natal. Não fique tão feliz assim… Não é você que eu quero. Não me olhe assim, não me encare desse jeito.

Não cabe no espaço do meu viver. Não cabe você.

Sinto muito.

Adeus.

Apaixonamento

menina mulherMarina caminhava sem rumo, olhando pontos desfocados de luz e sombra. Os olhos embaçados não se prendiam a nenhuma imagem, nenhuma cor, só luz e sombras alternavam em seu olhar. Sentou no banco de um lugar qualquer, não importava onde, andava perdida dentro de si mesma, que importava o mundo lá fora quando por dentro tudo era tormenta e furacão?

Sentiu um cheiro familiar, se forçou a ver. Viu cores, viu formas, viu um rosto que lembrava o gosto doce de morangos com marshmallow. Sorriu. Que mais podia fazer se era ele quem vinha caminhando em sua direção?
Sorriu um sorriso bobo, de quem se acha de repente, de que encontra um foco. E ele sorriu de volta.

Cores brilhantes luziram ao redor dela, sons, formas. E a vida jorrou de novo.

A dança

Ana olhava para o céu. Estava absorta na dança colorida das estrelas. Queria poder ser bailarina também, para saltar entre os espaços escuros do céu iluminando os sonhos dos apaixonados, dos amantes da vida. Aqueles que são crianças para sempre, apaixonados para sempre, deslumbrados para sempre. Os que descobrem o mundo em cada olhar, em cada suspiro.a dança

Ana olhava para o céu e via o balé das estrelas coloridas.

Invasão de privacidade

Sr. X era um cantor e compositor de anos passados que já não fazia tanto sucesso, a não ser para alguns fãs antigos, que ainda eram fiéis às suas composições e ideias. Cansou do lugar onde vivia e foi viver uma de suas músicas, pingando de paisagem em paisagem, nos versos da canção.
Anos depois surgiu um boato de que ele estaria sumido. Os jornais procuraram, os fãs procuraram, a TV achou.
Acabou-se o sossego.por do solJPG

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